sábado, 24 de abril de 2010

CHÁ DA TARDE COM O CHAPELEIRO TIM BURTON




O mundo anda cada vez mais estranho e bizarro e todos, hoje, vivem perdidos entre fantasia e realidade, em especial nós, “Alices” com cornetas e chapéus verde-amarelos num país não tão cheio de maravilhas assim, com exceção das naturais e do Cristo Redentor, quase que de braços pro ar ao invés de abertos. Lewis Carroll, a figura emblemática por trás do clássico da literatura “Alice no país das Maravilhas” talvez se embriagasse na fonte que nossa linda terra e seus personagens bizarros e malucos teriam a oferecer, para quem sabe um terceiro livro da série, mas a roteirista de Rei leão e Bela e a Fera - Linda Woolverton - tomou a dianteira e reescreveu a história à sua maneira, com toques feministas agraciados pela bizarrice enigmática do mestre Tim Burton que reproduziu do papel para as telas em 3D do mundo todo uma Alice revigorada. A versão da Disney do clássico inicia-se uma década depois, já com Alice mais velha e voltando ao mundo que havia visitado na infância, reencontrando assim antigos personagens, entre eles o fabuloso gato Cheshire e o alucinado Chapeleiro Maluco, que deixou de ser um personagem secundário, como no livro, para se tornar um coadjuvante importante, interpretado pelo pupilo de Burton e agora, “queridinho” da Disney, o aqui performático Johnny Depp, em mais uma atuação fascinante. Em todos filmes de Burton, a fantasia sempre foi uma forma de explorar a realidade e nesta versão de Alice a coisa não fica atrás. Além do deslumbramento visual (em especial às cópias 3D), Burton soube manter a linguagem de Carroll, apenas deixando esta nova versão menos enigmática e mais pragmática com pitadas de apologias revolucionárias, aqui lideradas pelo Chapeleiro de Depp. Por mais que centenas de análises, já tenham sido feitas, "Alice no País das Maravilhas" – o livro - permanece um enigma até hoje. Entrar em contato o tema e tentar absorver os personagens é como quebrar o "Código Da Vinci". Fato este que talvez se deva à origem de Carroll, que para quem não sabe, era matemático e usou de seus conhecimentos da artes dos números e da lógica para construir proposições em Alice no País da Maravilhas, sendo muitas vezes o significado particular da frase superado até pela própria forma, sugerindo jogos comuns em sua época. Lewis Carroll cresceu num ambiente familiar, onde aprendeu a contar histórias, cuidar e distrair crianças. Ele nunca assumiu sua paixão por meninas muito mais jovens, mas este fato ficou registrado através de várias fotos de nu infantil feitas por ele, que também era fotógrafo de sua época. A própria história de Alice foi criada em homenagem a uma menina de dez anos por quem Lewis era fissurado. Vale ressaltar antes que mandem cortar a cabeça do moço, que NUNCA houve qualquer suspeita ou acusação de envolvimento sexual com crianças, mas sim uma admiração além do normal, o que aliás, este estava longe de ser um adjetivo para Carroll. Assim como na Bíblia, há inúmeros códigos a serem decifrados em seus textos, e claro, infinitas interpretações de uma única frase ou um tema qualquer. Muito dizem que a porta que Alice abre para este mundo mágico, na realidade seria uma metáfora de eventos que poderiam ter acontecido se as pessoas tivessem aberto certas “portas”, ou como filosofara William Blake no passado: “Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito”. Aliás, frase esta que deu o nome da banda de Jim Morrison: The Doors. O livro Alice influenciou –e influencia – muita gente até hoje. Alguns exemplos são: o álbum Sgt. Peppers dos Beatles, o seriado Lost, a a trilogia de Matrix, os quadrinhos de Batman, até na medicina há influência de Alice, com o diagnóstico da síndrome de Alice, quando os objetos – ou coisas, situações - nos parecem muito maiores do que são na verdade. Voltando ao caso de Carroll e da jovem Alice - a real - as doze mudanças de tamanho sofridas por Alice – a personagem - ao longo da história poderiam estar ligadas ao desejo dele de que Alice Liddell fosse adulta para que pudesse se casar com ela. Entre outras suposições e códigos metafóricos, o Coelho Branco simbolizava o Parlamento Inglês, ironizando políticos, que geralmente correm muito em círculos, sem chegar a lugar algum. O enigmático Gato de Cheshire tem referência aos queijos do condado de Cheshire (onde Carroll nasceu) que tinham a forma de um gato sorridente. Ao partir o queijo, em seu formato felino, a tendência seria começar pela calda até que finalmente só restasse na travessa a cabeça sorridente, o que nos remete ao episódio no qual o gato desaparece a começar pela cauda e termina com o sorriso, tanto no livro, como no filme. A Rainha Vermelha – no filme, interpretada pela esposa de Burton, a atriz Helena Bonham Carter, apresenta um quadro de narcisismo exacerbado, apesar da cabeça gigante, uma ausência de compaixão e de empatia por seres vivos, além de tendência a comportamento violento. A centopéia é dependente de alucinógenos, assim como diriam as más línguas, o próprio Carroll. Fato é que estes personagens fantásticos e o mundo maravilhoso de Alice merecem serem conferidos nas telas e claro, revistos para quem já leu, e descoberto por quem ainda não leu, nas duas obras de Lewis, “Alice no país das maravilhas” e “Alice através do Espelho”. Um bom incentivo para se atirar buraco adentro para este mundo real ou imaginário - depende da ótica de quem lê - é conferir mais uma grande obra de Tim Burton e seu cavaleiro alado, Johnny “O Cara” Depp. Afinal, como diria Cheshire: “Vocês também devem ser loucos, caso contrário não viriam para cá”. Um brinde de chá com Chapeleiro Burton em homenagem a esta grande obra!

terça-feira, 6 de abril de 2010

ETERNAMENTE JOVENS DE CORAÇÃO



Dante Alighieri se passasse férias no Brasil com certeza rasgaria sua obra mais notável, A Divina Comédia, por considerá-la gibi infantil perto de nossas barbáries. Um casal executa o próprio filho, é condenado e daqui oito anos estarão livres como pássaros, assim como o falso ator que matou a atriz a tesouradas e o assassino que arrastou o menino João Hélio, pelas ruas do RJ até sua morte, todos livres pela justiça, não é divino e cômico? Malufs, Sarneys e mais um bando de “cidadãos exemplares de nossa justa política” são investigados até fora de nosso país e aqui em casa mandam, desmandam, e continuam se apossando ilegalmente de fortunas incalculáveis e também não dá em nada. Bom, eu poderia descrever no mínimo noventa infernos nesta terra ao invés dos nove de Dante, mas creio que nem o poeta Virgilio, guiaria o já velhinho Dante, dentro de um trem da EMTU. Algum dos meus sete leitores, por acaso já utilizou (ou tentou) os serviços de trens metropolitanos em horário de pico? O inferno é playground comparado a esta viagem. Por acaso alguém já esteve no serviço público hospitalar em emergências e viu como pessoas idosas são tratadas? E emprego? No Brasil quarenta anos já é considerado velho para ser empregado, imagine quem tem setenta? Claro que tem a aposentadoria, evidente. Basta você pagar pro governo a vida inteira e torcer para que o rombo da previdência (olha o dinheiro que sai do país na mão de bandidos eleitos pelo povo) tenha deixado ao menos algumas migalhas para você ao menos comprar remédios de pressão e fraldas geriátricas. Por estas e outras, envelhecer no Brasil é padecer das chagas de Cristo. Claro que nossos políticos, em sua maioria velhos, caducos e cada vez mais experientes para o crime e a corrupção,se preocupam e muito com nossos pais, avós e bisavós. Não viram a lei do estacionamento em shoppings e mercados? Tudo que nossos idosos precisavam: vagas para comprar! Agora inventaram que até dentro de shopping você pode ter seu veículo multado. Dante pensou nisto? Não, pois nem o diabo pensaria em radares mal calibrados, amarelinhos picaretas e gananciosos e o xeque mate da genialidade: as vagas de idosos. Quem vai a favor de um canalha que leva multa porque parou numa das 90 vagas vazias para idosos? Ponto para os idosos, já que toda a arrecadação das multas será destinada a centros de referência de idosos, correto? Claro que não! Ainda bem que o mundo não é só feito de Brasil e em outros países mais desenvolvidos idoso, criança, homem, mulher,enfim, ser humano é tratado como ser humano. O belíssimo filme Young at Heart é uma declaração poética a este respeito e amor a gente que não envelheceu, mas sim amadureceu e ao contrário daqui onde se jogam para um canto qualquer da sala, lá se torna centro das atenções. O documentário do diretor Stephen Walker retrata a vida de um coral formado por idosos liderados pelo genial Bob Cilman com um repertório popular que varia de James Brown a Cold Play, além de muito rock and roll, tanto no som quanto na postura da turma. Aliás, os velhinhos dão uma aula de bom humor, rebeldia e acima de tudo carisma e emoção, levando às lágrimas por exemplo uma platéia formada por presidiários, além é claro do público de teatros por onde passam. No documentário eles fazem piada com sexo geriátrico, incontinência, habilidades na direção e até mesmo zombam da morte, nos jogando na cara que o moço que não chora é selvagem e o velho que não ri é um tolo. Em tempos de bandas fakes ou bandas emos, eu tatuaria no meu braço o nome de cada um destes senhores (as) que nos dão uma aula sobre a vida. Cada um tem a idade que seu coração deseja ter, pois tem gente que já nasceu velho e tem outros que jamais irão envelhecer. Young at Heart é poesia pura com momentos memoráveis, como a saudade deixada por dois membros do grupo que morrem antes da estréia do show. A canção Fix You da banda ColdPlay, interpretada visceralmente por um senhor que perdeu seu melhor amigo e com quem faria um dueto na canção, é de emocionar até o mais frios dos seres vivos e de uma qualidade digna de ser considerada uma das mais belas cenas que o cinema já produziu, com a diferença de ser REAL! Feliz daquele que nasce num país livre e justo, porém mais feliz ainda daquele que envelhece num país onde o respeito e o amor são maiores do que qualquer coisa. Meus caros e futuramente, sete leitores anciões, mas eternamente jovens de coração lembrem-se de que uma bela velhice é, ordinariamente, a recompensa de uma bela vida.