quarta-feira, 13 de agosto de 2008

A VOLTA DOS QUE NÃO FORAM



Se tem uma figura do cinema brasileiro que eu admiro e que até tive até a honra de dirigi-lo e também entrevistá-lo, esta figura chama-se Zé do Caixão. Um grande gênio, porém desmerecido, como a maioria dos que nasceram em nosso país. José Mojica Marins é hoje sem dúvida o cineasta brasileiro mais visto e cultuado no mundo. Recebeu inúmeros prêmios em vários países como Espanha, França e Estados Unidos, onde é conhecido como Coffin Joe, onde inclusive recebeu um prêmio pelo conjunto de sua obra no Sundance Festival, o maior do cinema independente mundial. Quando tive a honra de entrevistá-lo me mostrou o anel que pertencia à Boris Karloff (ícone máximo do terror) e a filha do mesmo fez questão de presentea-lo com o adereço. Inúmeros diretores americanos admiram o trabalho de Coffin Joe, como por exemplo Robie Zombie, que ao tocar no Brasil com sua banda White Zombie fez questão de chamar Zé ao palco e homenageá-lo. Tudo isto pra ver como nosso país é engraçado e cruel em termos de valorização. Nelson Rodrigues, o mestre, dizia que o brasileiro é um Narciso às avessas porque cospe na própria imagem. Vejam o caso do Rodrigo Santoro: o rapaz é bonito, talentoso, simpático e vem crescendo horrores fora do Brasil, mas a crítica tem de falar mal. Faz o filme das Panteras, metem o pau, trabalha no Lost, metem o pau, é o antagonista de um blockbuster como 300 e falam mal. Acho que descobri a “grande falha” do Santoro e do Zé: a humildade. Se Rodrigo fosse um starlet nojento, dariam valor, assim como Zé que se cantasse de galo e fizesse pose de diretor “meia boca” que é o que mais tem neste país, os “falsos intelectuais”, que discursam seus filmes como um Godart mas o dirigem como um John Waters, talvez assim nosso Coffin Joe seria mais valorizado. Mas como tudo nesta vida tem seu tempo certo pra acontecer, não é que depois de um hiato de 40 anos, a trilogia Zé do Caixão se encerra (???) com o filme “ A encaranação do demônio” e nosso amigo José Mojica desfila pelas páginas de jornais e revistas. É a verdadeira volta daquele que nunca foi: nosso mestre do terror. Àqueles que denominam os filmes de Zé como TRASH, deveriam ficar mais atentos, pois é inegável que com o passar dos anos, ele até degringolou para este lado, porém como um Ed Wood, foi mais por falta de opção e por tiração de sarro mesmo, porque os filmes antigos de Zé nada tem de trash, pois contam uma história reta e você não vê falhas técnicas grosseiras, mesmo com um orçamento mais apertado que a garganta do machão que ao ver 3000 baratas desfilarem por uma mulher, engole o grito de terror. Zé do Caixão é nossa Múmia, nosso Drácula, nosso Lobisomen, só que real. Faz parte da nossa cultura popular e hoje, da mundial, tendo seus filmes vendidos no mundo todo, sendo que os canais a cabo franceses já exibiram quase toda sua obra e nos EUA seus filmes saem LEGENDADOS (americano odeia legenda e 99% dos filmes estrangeiros são dublados), pois os fãs apreciam a interpretação do Zé e sua voz sinistra. O Coffin Joe não acredita em Deus, nem no Diabo. Ele não acredita em espírito desencarnado, não acredita em nada, a não ser na força da mente. Força da mente esta que fez o menino de seis anos, filho de funcionários de cinema, se tornar anos depois um ícone da sétima arte. Me contou que ao mostrar seu primeiro filme (ainda criança) ao padre da cidade, o religioso chamou os pais do garoto e disse: este menino tem sérios problemas mentais. Ainda bem que o louco, mal falado, marginal, que teve suas fitas destruídas pela ditadura por acharem (como sempre acharam tudo) que ele era satanista, não desistiu nunca. Acreditou sempre no poder da mente e hoje com 72 anos de idade, vem com um filme orçado em 1,4 milhões, numa superprodução com elementos de terror como nenhum outro filme nacional fez até hoje. Com a fotografia de José Roberto Eliezer, um figurino desenhado pelo estilista Alexandre Herchcovitch, além das participações de Zé Celso Martinez Correa e Jece Valadão em seu último filme, finalmente chega ao público este coquetel de terror de Zé do Caixão, menos trash e muito mais realista. Admito não ser um fã ardoroso do gênero de terror, mas admiro José Mojica e como vi os dois anteriores não deixaria de ver como se fecha esta trilogia. A coluna de hoje é inteiramente em homenagem a este amigo e cineasta de respeito: José Mojica Marins, nosso eterno Zé do Caixão e o Coffin Joe do mundo.







PUBLICADA NO JORNAL GUARULHOS HOJE DIAS 09 E 11 DE AGOSTO DE 2008

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