sexta-feira, 15 de abril de 2011
O BRILHO ETERNO DA TELA DO CINE STAR
A casa da saudade chama-se memória. É uma cabana bem pequenina em um canto do coração e visitando-a estes dias pude ver brilhar no lago transparente de minhas lembranças, a fachada do Cine Star, o verdadeiro templo do cinema em Guarulhos. A escada de mármore com os cartazes das futuras estréias, colados à parede; o cheiro de pipoca, o bilheteiro simpático , que chamaremos aqui de José, figura folclórica na cidade de Guarulhos para os que já tem mais de trinta, porque falando em Cine Star todos trazem este senhor em sua memória: velhinho, calvo, barrigudinho, um doce e sincero sorriso no rosto e aquele uniforme cheirando naftalina, que nos abria as portas para o mundo mágico do cinema. O doce aroma da sala de espera com a doceira no canto direito, onde se consumiam Confetes e Mentex, assim como se consomem Big Macs nos dias de hoje, me fazem sonhar. As portas da sala de projeção se abriam e a turma da sessão anterior saia e pelas expressões, já poderíamos ter um prévia de que o filme seria bom ou não. Eram os melhores críticos. Ao adentrarmos a sala, com suas cadeiras de estofamento vermelho e luzes baixas nas laterais do ambiente, podíamos ver a figura sempre solícita do extinto lanterninha, que além de ajudar-nos a encontrar um lugar, caso a sessão tivesse começado, evitava também aquela cambada de chatos que vão no cinema pra bater papo ou pra bagunçar, não dando a mínima importância a quem pagou para ver o filme. Esta figura extinta nos dá saudades, pois hoje em tempos modernos mas de uma ignorância pré-histórica, alguns elementos até atendem celulares e discutem relação no decorrer da sessão mesmo aos protestos de PSIIUUU. Mas isto fica pra uma outra coluna, então voltando ao Cine Star, antes do filme se iniciar a sala era tomada por trilhas sonoras que variavam de Ray Conniff até o mestre das trilhas de filmes, o senhor Ennio Morricone. Sem sombra de dúvida preparando um clima de cinema bem diferente da rádio Trama, por exemplo, onde você suplica pro filme começar logo e não ter de ouvir aquelas músicas insuportavelmente chatas e pretensiosas. Quando as luzes se apagavam e a sessão começava, vinham evidentemente os trailers, o chatíssimo curta obrigatório e claro o jornal Canal 100, lembram? "Que bonito é....lá lá lá....”, veio a musiquinha de futebol na cabeça e os gols da semana em tela gigante, não? Pra quem curtia futebol era o ápice, as vezes melhor que o próprio filme. Pra quem preferia a companhia das mulheres, graças a deus, meu caso desde garotinho, esta era a hora de pegar na mão e claro dar aquele beijo. Nem que fosse no rosto apenas. A emoção era a mesma e o romantismo ainda existia, já que gostoso era o momento em que você e a garota se envolviam fazendo o amor parecer uma noite estrelada em que até a lua parecia estar também apaixonada. Bons tempos. Mas olha eu fugindo pra outro assunto de novo. Tudo bem. É o amor. Enfim, o filme começava e ai nossa emoção disparava. Clássicos, blockbusters, filmes de terror, nacionais, comédia, o Cine Star era palco pra todo gênero. Não tinha preconceitos culturais. Me recordo das sessões regadas a Mentex e Guaraná Antártica ao lado de minha já ausente vovó, nos divertindo com as confusões de Trinity e Bud Spencer. Lembro-me como se fosse ontem, graças ao recurso do DVD e minha vasta coleção de filmes - o que me ajuda a recordar - quando vi pela primeira vez A Dama de Vermelho e fiquei sem dormir umas quatro noites seguidas, excitado sonhando com a calcinha da Kelly Le Brock.Lembro-me de quando eu e meu atual compadre, saímos da sala na metade do filme Superman IV, hábito este que mantive até hoje quando o filme é ruim, pois valorizo demais meu tempo para desperdiçá-lo assim a toa. Em compensação lembro de ter batido o recorde ao assistir 19 vezes, Máquina Mortífera com Mel Gibson e Danny Glover. Me recordo também do medo que tive ao assistir o rosto de um homem se desfazendo em Poltergeist ou a cabeça de outro rolando após ser decapitada em A Hora do Lobisomem. Ainda bem que tinham momentos de aventura como Caçadores da Arca Perdida, ou então comédias inesquecíveis como Na trilha da Pantera Cor de Rosa, onde o gênio Peter Sellers conseguia fazer a platéia gargalhar. Sem contar ainda a torcida que gritava "Rocky, Rocky, Rocky" em Rocky IV, torcendo contra Drago. Tanta lembrança boa, tanta magia, tanta felicidade e como tudo nesta vida, o Cine Star se acabou, ou não sei o que é pior, se transformou no que hoje chamamos de Câmara dos Vereadores, onde as histórias não são em película, mas sim apresentadas em tempo real e nem sempre belas, interessantes e muito menos engraçadas. Talvez Poltergeist e Hora do Lobisomem dessem menos pânico na população. Mas vamos torcer que uma direção, quem sabe, desta nova etapa do Cine “Câmara” Star mude e que os bons filmes e os momentos felizesnão fiquem apenas em nossas lembranças do passado, pois podemos viver a historia e senti-la com nostalgia, porque a historia é feita de pequenas historias da nossa vida. Nostalgia é saudade do que vivemos e melancolia é saudade do que não vivemos. Então vamos aguardar o inicio da nova sessão. Já entregamos o ingresso pro senhor José. Um bom filme a todos!
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